foto: Renato Soares"_ De que nação és? perguntou-lhe o cavaleiro em guarani.
_Goitacá, respondeu o selvagem erguendo a cabeça com altivez.
_Como te chamas?
_ Peri, filho de Ararê, primeiro de sua tribo"
José de Alencar: O Guarani
Minha cidade,Campos dos Goytacazes,traz no nome a marca do povo Goitacá, habitantes das planícies e restingas do Norte Fluminense quando da chegada dos colonizadores. São recortes desta história extraordinária que espero registrar aqui: um pouco do"popular,lendário", um pouco do "testemunho e documento".
A aversão dos goitacás ao colonizador já seria compreensível pelo instinto natural de defesa do seu território contra o intruso desconhecido, "inimigos superiores em organização e armas"; além disso, cresce a hostilidade do índio diante de bárbaros ataques, dizimando aldeias inteiras, sem perdoar sexo ou idade, e,"dos seus processos escravizadores e suas constantes quebra de palavra". O máximo da crueldade, porém, foi o artifício de disseminar a varíola, espalhando, nos acessos às aldeias, roupas contaminadas pela doença. Alberto Ribeiro Lamego, O Homem e o Brejo.
"Tragadores de carne humana, de cujos ossos fazem grandes montes em seus terreiros"... " e disto se jactam; e quanto maior for a ruma das ossadas dos que mataram e comeram, tanto maior fica sendo a nobreza de cada qual das casas. Estes são seus brasões de suas proezas."
moeda de 100 réis, 1932, IV centenário da colonização
Através do roteiro de suas viagens, escrito por Maldonado, temos conhecimento de fatos interessantes que se passaram naquela época, como as pazes feitas com os índios goitacás que viviam na Lagoa Feia "o grande mar de água doce, como eles lhe chamavam pelo seu idioma..."; o encontro com náufragos portugueses que viviam numa aldeia goitacá no cabo de São Tomé "Nisto chegaram todos de arcos e flechas, o seu maioral na frente, acompanhados de quatro homens da nossa massa, estes nos saudaram junto com o maioral pelo seu belo modo...Nisto o maioral dirigiu ordem para todos recolherem arcos debaixo do braço e todos bateram palmas e baixaram as cabeças, o maioral se dirigiu ao intérprete, para que nos fizesse saber que não reparássemos em virem de arcos, pois não sabiam se viriam outros que os viessem atacar..."
http://www.multirio.rj.gov.br/historia/modulo01/cap_hereditarias.html
" Habitam choças de palha, fundadas cada qual sobre um esteio de pau metido na areia, por mor segurança dos seus contrários,cercados sobretudo de matas espessas, rios e charcos inacessíveis".
http://florabrasiliensis.cria.org.br/
pintura - Rugendas
pintura- Ostium Fluminis Paraybae, Frans PostEsta peça, um canhão, se encontra na praça da rua das palmeiras em São João da Barra.
" A terra é possuída e habitada pelos Goitacases, selvagens tão ferozes e bravios, que não podem viver em paz com outros"..."Quando são apertados e perseguidos por seus inimigos, os quais ainda não os puderam vencer nem domar, andam tão rápidos a pé, e correm tão ligeiros, que não só deste modo evitam o perigo da morte, mas também no exercício da caça apanham na carreira certos animais silvestres, espécies de veados e corças"
pintura - Debret
Foto de Renato Soares - http://www.imagensdobrasil.art.br/
Pêro de Góis é "um dos moços capitães vindos com Martim Afonso de Souza" na primeira expedição efetiva de colonização do "grande desertão", as terras brasileiras, em 1530. Por bravura em serviços prestados à Coroa, ganha uma capitania de trinta léguas, São Tomé, da qual toma posse em 1538.
Sua primeira tentativa de povoação na terra dos goitacases é a Vila da Rainha, ao sul das margens do rio Manajé (depois Itabopoana, hoje Itabapuana), onde levanta uma capela , um engenho d'água, introduz cabeças de gado, alguma lavoura e canavial, uma casa da Câmara e casebres de taipa.
"Fiz mui boa povoação, com muitos moradores, muita fazenda...estando assim mui contentes com ter a terra muito pacífica..."
Pero de Góis, carta a Martim Ferreira em 18/08/1545
Curioso que a ferocidade do índio seja sempre exaltada, e nessa carta esteja registrado o adjetivo "pacífica" para uma primeira povoação em terra de índio! Faz lembrar o trecho da Carta de Caminha, a respeito da primeira visita de dois índios à caravela de Cabral, quando ao fim do encontro, deitaram-se de costas no tapete, aconchegaram-se e dormiram.

Jogamos tua Língua
Renato Soares fotos http://www.imaginabilis.com.br
A presença humana no Brasil está documentada num período situado entre 11 e 12 mil anos atrás, datação sempre revista em função de novas descobertas. Estima-se em até 10 milhões de indivíduos, cerca de 1.300 línguas diferentes, em sociedades indígenas à época da chegada dos europeus, exterminadas gradativamente pelo processo de colonização baseado na força e na política de assimilação.
http://www.funai.gov.br/indios/conteudo.htm#ORIGEMNo
"Alguns anos após a chegada dos europeus ao continente que hoje chamamos de americano, enviaram-se comissões de investigação para pesquisar se os indígenas possuíam ou não alma. Questão essa que só foi resolvida em 1537, quando o Papa Paulo III declarou numa Bula que os indígenas eram entes humanos como os demais homens." Marina Azem
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"Sobre o mar, Portugal abre todas as velas"..."É o tombo do Globo que se faz pela vez primeira. Suas naus, prenhes de audácia, de cobiça e de aventura, ninam sobre o mar, em seus ventres rotundos, a supergestação de vários novos mundos"
fotografia de Wank Carmo